24 de dez. de 2009

Adeus ano velho

clip_image002- Bom dia Robert -, perguntou o alterego de Robert que por ali passava. – Bom dia Smith -, respondeu-lhe. Nesse momento, esperava-se pela sequência normal que completaria o discurso – tudo bem, meu jovem amigo? Hoje é véspera de natal e próxima semana entraremos no décimo ano do século XXI, é honra ter chegado até aqui, tamanha as dificuldades enfrentadas e, com muito esforço, superadas; visíveis conquistas e experiências apreendidas, de modo que me sinto muito ansioso e esperançoso com o novo ano –, disse eloquentemente Smith, cheio de euforia –. Não me surpreende que estejas animado, afinal fazemos tudo às pressas, corremos com o dia, dia após dia, para nos livrarmos da frustração do quotidiano e alcançarmos o quanto antes o próximo para, na maioria das vezes, fazermos as mesmas práticas –. Redarguiu Robert que assim continuou: – Alguns objetivos se impõem à nossa conquista, uma regra válida para fartar nossos desejos insubmissos e insaciáveis. Passamos o ano inteiro procurando alcançar sucesso pessoal que se traduzem comodamente em dinheiro e amor. Dois objetos que mais se parecem com virtudes, sabendo-as imprescindíveis, mas ao contrário do que aparentam, nada fáceis de obter. O “Money” é motivo de viver, sem ele, torna-se desmotivada a vida, mas raros os homens que se dizem desmotivados – que o digam os mendigos –, sempre conseguindo o ganha-pão, sempre com uma ou duas moedas no bolso furado, ganhando a vida porque vivem na agonia, mergulhados em esperanças perdidas alimentadas pela fé, fonte inesgotável de poder; aliás, tão bem praticada pelo nosso patrono Jesus Cristo. – Sim, nosso primeiro motivo de viver é o dinheiro, sendo ele pouco ou muito ou nada, ainda assim astuto, irrefreável e disponível. E o amor? Indagou-lhe Smith não compreendendo muito aonde o orador pretendia chegar, mas admirado pelas palavras, decidiu aguardar o final da explanação. – O amor é sempre uma conquista insana, depende de vários fatores para nutrir-nos com seus frutos, também insaciáveis, caros e tão trabalhosos de conseguir quanto o dinheiro. Uma procura sempre disfarçada que se pretende adquirir sem esforço, por espontaneidade, casualmente. Uma mentira. O amor surge como necessidade de ser feliz, mas não se pode traduzi-la como felicidade. É parte fundamental, mas... pode-se mesmo ser feliz acaso sem amor ou ter-se amor sem se ser feliz? – Sim, é viável. Porque amei o ano inteiro e continuei infeliz, e a maior parte da minha trajetória fui feliz, muitas vezes, sem mesmo amar. – Expressa Smith de acordo com Robert. Ingratos esses sentimentos que perpassam nossas memórias, síndromes de nossa cultura, enraizadas e preconizadas aquém e acolá. Injustiça de almas impregnadas pelo desejo de ser feliz. Felicidade que quase não aparece e que insiste em manter inalterado certo egoísmo e burrice de buscar sempre as mesmas realizações. Desista pois de tua ansiedade, meu caro Smith, olhe para o céu e veja o padrão do sol nascente e poente, da lua e suas fases, das estrelas e sua disposição, dos poucos momentos de felicidade e muitos de infelicidade, outros de amor e ódio; dessa dualidade composta de erros e acertos, desesperos e esperanças, ou seja, da vida e seus círculos viciosos. Diga adeus a esse ano, e não anseie que o próximo te seja diferente porque não o será. – Smith odiou aquele tom de repugnância e indiferença, notou uma certa expressão infeliz, mas deixou que seu bom sentimento e esperança falassem mais alto e, desinibido e também indiferente, desejou um feliz natal e próspero ano novo a seu companheiro. Sabia que a trilha era longa e, certo de alcançá-la, continuou seu trajeto.