8 de jan. de 2014

Texto 1 - A energia elétrica

A energia elétrica

O negócio está mal. Aqui não há água, há pelo menos 20 dias. Ninguém se pronunciou ainda. Mas desse problema vou falar noutro texto. O de agora é a luz.
olhos no escuro
Nos três meses passados, a luz era concedida em horários específicos, por exemplo, nos horários em que os indivíduos trabalham. Das 8 horas às 11 horas, havia luz, depois ia e voltava só às 13 horas. Ficava mais uma ou duas horas e só voltava às 16 horas. Depois ficava mais duas horas. E partia pra valer às 18 horas, horário em que as pessoas voltam do trabalho. Daí, só voltava às 23 horas. Isso durante três meses seguidos. Ninguém explicou o porquê. 

Uma teoria se generalizava diante de toda escuridão: as horas em que não havia luz eram as mais preciosas para a maioria dos indivíduos, principalmente o horário noturno. Essa falta gerava uma necessidade enorme. Como resultado, os indivíduos se enfileiravam  nos postos de combustível para comprar gasolina, principal ingrediente do gerador. Todos tinham gerador. 

Um desses indivíduos de plantão, brincando com seus neurónios, decidiu fazer um cálculo maluco. Considerou o seguinte:

A cidade tem aproximadamente 7 milhões de habitantes, dos quais, pelo menos 5 milhões vivem o cotidiano descrito acima. Se uma máquina, denominada gerador de energia elétrica, principal utensílio doméstico desses, consome em média 1 litro de gasolina por hora e, diariamente, o cidadão utiliza o gerador por 5 horas, então o resultado seria absurdo. 

Espere caro leitor, vamos já ao resultado, mas antes, quero acrescentar algo.

Normalmente, o indivíduo, trabalhador, que chega a casa cansado, quer ter energia elétrica. Pelo menos espera sempre por isso. Ele encontrará a água gelada, indispensável nesse país, que faz calor o ano inteiro, poderá ligar o ar-condicionado, ou o ventilador, encontrará seu alimento conservado, poderá assistir à televisão e usar o computador, caso necessite fazer um  trabalho. A energia é uma necessidade de primeira mão. Por isso foi inventada. E já tem muito tempo!

Voltando ao cálculo, sem querer bancar um matemático, o plantonista ficou com 5 litros/dia X 30 dias = 150 litros/mês. Esse valor multiplicado por 5 milhões é igual à 750 milhões de litros de gasolina por mês. Não quero pensar quantos barris o país produz por dia. Fique para o leitor.  Nesse cálculo, acrescentamos outro ingrediente: o valor da gasolina. 750 milhões de litros X 0,60 (dólares) = $450.000.000,00 (dólares). Isso é muito dinheiro ganho pelas petrolíferas, principais empresas do país.

Vamos diminuir esse cálculo para o indivíduo trabalhador, que vive no primeiro país mais caro do mundo, onde o salário mínimo é de apenas $ 100,00 (dólares). Esse santo trabalhador gasta em média, por mês, 150 litros de gasolina por dia. Isso equivale à $ 90,00. Assustador não é? Que trabalhador vai gastar 90% do seu salário para ter luz em casa, supondo que ganhe o mínimo?

Esse cálculo foi feito apenas com uma província do país, a capital econômica. Outros 10 milhões de habitantes passam pelo mesmo transtorno no restante do país.

Nesse momento, o caro leitor sente pena do indivíduo e indignação com o país, que adota essa política. Mas esse nem é o real problema desses indivíduos. Esqueci de acrescentar que o valor da contribuição mensal do fornecimento da energia elétrica é de $ 20,00 (dólares). Somado ao valor do combustível do gerador,  supera o salário mínimo estipulado pelo governo. 

Só amarrando o final, fique sabendo que a luz voltou aqui, já há dez dias não falta. Noutros muitos bairros, tudo continua igual. O governo anunciou bons rendimentos no ano passado. Imagino o porquê. Mas como diz o ditado "alegria de pobre dura pouco". A luz voltou, a água foi no lugar. Ou o povo paga a parte pra ter água, ou paga a luz; ou os dois.

Ah! Esqueci de dizer, o lugar é Luanda; o país, Angola; e o povo é feliz. É isso mesmo, o povo é feliz. Veremos nos próximos dias por quê.


Até lá!


Sérgio Ventura

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